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Dança profissional e gravidez: sim, é possível

Ser mãe é um sonho. Um desejo que a grande maioria das mulheres não está disposta a deixar de concretizar, mesmo tendo consciência que se trata de uma decisão que vai mudar a sua vida para sempre.

As bailarinas não são, obviamente, exceção. No entanto, quando engravidam, muitas têm medo de continuar a trabalhar, o que não deixa de ser algo natural e compreensível. O corpo muda, o equilíbrio, a elasticidade e a coordenação também. O medo de prejudicar o bebé impõe-se.

No entanto, nada é impossível e muitas bailarinas profissionais há que continuam a trabalhar até ao fim da gravidez. Mas atenção: nada deve ser feito sem autorização e acompanhamento médico, com cuidados redobrados no que respeita à alimentação e à atividade física, adaptando tudo o que for necessário.

VÍDEO GRAVADO DURANTE UMA AULA QUE JANDIRA BAPTISTA DEU COM O BAILARINO TARIK CHAND, NO “AT YOUR BEAT STUDIO”, EM LONDRES.

Jandira Baptista:
a bailarina que dançou até ao final da gravidez

Bailarina profissional e professora de dança, Jandira Baptista escolheu viver este período da sua vida a trabalhar e a dançar até muito pouco tempo antes de dar à luz.

“Sinto-me bem, abençoada e inspirada! Ansiosa por ter a minha pequena em meus braços”, disse a mais recente mamã, aquando da nossa conversa, uns dias antes da sua filha Zoe nascer. E continua: “Quando olho para trás orgulho-me, estou em paz. Tenho muito que fazer, mas estou ciente de que sou capaz e de que ser mãe me dá ainda mais força.”

Jandira nasceu em Portugal, há 33 anos. Há cerca de 10 meses mudou-se para Londres, com o objetivo de dançar muito e crescer ainda mais enquanto bailarina e professora de dança. Escusado será dizer que a gravidez não foi, de todo, programada e que era algo que, na altura, não esperava.

Soube que ia ser mãe já em Londres, com três meses de gestação. “Penso que foi a adrenalina e a ansiedade da mudança que não me deixaram perceber antes. Estava a preparar-me para trabalhar fora do meu país, para fazer audições, treinar, entre muitas outras coisas”, conta.

Sentiu-se a 200% fora da sua zona de conforto: “Foi um misto de felicidade com pânico. Não estava sequer em minha casa. Tive inseguranças em relação à carreira, em como iria gerir este recomeço com a gravidez e, além disso, o fator idade também me deu que pensar… Saiu tudo diferente daquilo que tinha planeado, mas aceitei. Ser mãe sempre fez parte dos meus sonhos, tomei a decisão de seguir em frente e, rapidamente, tudo se tornou secundário.”

Dançar é uma forma de esquecer os sintomas da gravidez

Para a bailarina, trabalhar grávida é “viver um dia de cada vez”, consciente que de há dias melhores e piores, alguns cansativos e stressantes. Mas, nem tudo é mau, dançar foi uma forma de se abstrair dos sintomas da gravidez e de estar ativa. A partir dos cinco meses abrandou, passou a trabalhar entre dois a três dias por semana e, no final, apenas um dia. Porém, sem nunca deixar de treinar. Deu aulas sem dificuldade, sentiu-se sempre bem, até porque “é algo natural” para si. No final de cada sessão, sentia que “toda a energia desaparecia”.

A pequena Zoe nasceu em Londres, no dia 11 de junho. É filha do bailarino Edgar Carvalho, que se mudou com Jandira para a capital do Reino Unido.

Para terminar, a mãe da Zoe deixa uma mensagem de otimismo: “Não tenham medo. Só paramos se quisermos. É preciso muita disciplina e vontade, mas tudo se faz. Somos privilegiadas, porque o que fazemos permite-nos conciliar o nosso trabalho com a maternidade e com o estar mais tempo com a criança. Agrada-me a ideia de ir ensaiar ou de ir dar aulas e levar a minha pequena. Façam por relaxar e respeitar cada fase. Aproveitem para aprender a fazer outras coisas. Observem os outros a dançar, o movimento. Financeiramente, se possível, é bom ter ‘um pé de meia’, para este tipo de surpresas, excelentes! Senão, há sempre solução.”

A história de Jandira

“Dança significa vida”
Jandira Baptista dança desde sempre. Cresceu num ambiente de DJ’s e bailarinos. Porém, a nível profissional, iniciou-se tarde, aos 22 anos. Pensava que o futuro lhe reservava uma carreira enquanto estilista ou ligada à política, isto porque desenhava roupa e fazia desenho de observação a óleo e, também, porque o seu avô era empresário e diplomata, acabando por captar o seu interesse para as políticas sociais e de sustentabilidade.

A sua carreira na dança começou quando, finalmente, decidiu enfrentar o medo de participar em competições. Foi-se destacando e ganhando prémios em eventos nacionais e internacionais, conhecendo pessoas na área e sendo convidada para dar aulas. Tudo aconteceu naturalmente. Começou a viajar através da dança e a organizar eventos e workshops como forma de contribuir para o desenvolvimento da comunidade em Portugal.

Dança um pouco de tudo e, atualmente, dá, sobretudo, aulas de Hip Hop, House, Waacking, Popping e High Heels.

Fábio Krayze: “Sou muito mais que kudurista. Sou bailarino”

Celebra-se hoje o Dia Mundial da Dança

Foi com o seu sorriso largo, carisma, humildade, energia, cómica forma de estar e, obviamente, com o seu talento enquanto bailarino, que Fábio Jorge, mais conhecido por Fábio Krayze, conquistou o coração dos portugueses, durante a sua participação no programa de talentos “Achas que sabes dançar?”, há cerca de quatro anos.

No dia em que fizemos esta entrevista, encontrámo-nos na zona de Santos, onde Fábio dá aulas. Era noite, estava frio, mas acabámos sentados a conversar junto ao Tejo. Com vista privilegiada para a Ponte 25 de Abril.

Fábio nasceu em Luanda, em agosto de 1988. Veio para Portugal aos 13 anos. E recorda com nostalgia os tempos de infância, o bairro pobre onde viveu, a família, os amigos, as brincadeiras e as danças de rua. Era mesmo muito feliz. Sente saudade. Porém, se lhe perguntarmos se quer voltar, diz que não.

É de poucas palavras, mas respondeu a tudo o que lhe foi perguntado. Sempre com sentido de humor e com um enorme brilho nos olhos. Afirma-se tímido. Mas não parece! É “muito mais” que kudurista, não gosta desse rótulo. É bailarino! A dança é sem dúvida a sua vida, no entanto quer apostar também na música. É um sonho.

Na sua opinião, Portugal tem bailarinos de muito talento. Contudo, lamenta que no nosso país não haja o empenho e o rigor que existe noutros locais da Europa, em relação à formação e ao treino intensivo, sobretudo na área das Danças Urbanas.

Para o futuro, Fábio Jorge ambiciona “apenas” uma coisa: ser feliz.

Histórias – Fábio Krayze, de onde vem esta alcunha?
Fábio – Vem do tempo do secundário, da altura em que pertencia ao grupo Pupilos do Kuduro. Um deles começou a chamar-me Crazy Frog, porque eu era muito irrequieto! Com o tempo “perdi o frog” e passei a ser Krayze.

Histórias – Continuas muito irrequieto?
Fábio – Já não! Estou bem mais tranquilo…

Histórias – Esta alcunha combina com Kuduro, que é um estilo um pouco louco…Fábio – Louco, mas no bom sentido, atenção! Sim, tem tudo a ver, daí a ter mantido.

Histórias – Como é que explicas o que é Kuduro, a quem não conhece?
Fábio – Numa linguagem mais leiga, eu definiria Kuduro como uma dança energética, divertida e com muito foot work. Para mim, além de alegria e explosão de energia, Kuduro significa vida e fuga.

Este estilo nasceu em Angola nos anos 80, altura da guerra. Era uma forma das crianças não estarem muito focadas nos problemas da violência e da fome… Dançávamos Kuduro para nos mantermos à parte de tudo isso. Era o nosso escape!

Histórias – Já se dança muito Kuduro em Portugal?
Fábio –
Dança, mas já se dançou mais! Quando vim para Portugal, em 2001, só se dançava Kuduro nos subúrbios. Mais tarde, tornou-se mainstream! A grande explosão da Kizomba, há cerca de quatro anos, acabou por trazer com ela o Kuduro e, nessa altura, havia mesmo muita gente a dançar.

Hoje em dia, o Afrohouse está mais na moda. Tem uma batida mais lenta, é mais melódico e, na generalidade, as pessoas gostam mais.

Histórias – És um pouco responsável por essa explosão?
Fábio – Não!… No meio mainstream, talvez! A Blaya começou a dar aulas e acabou por me trazer também para o meio das academias de dança. Mas existem muito bons bailarinos de Kuduro, simplesmente não são conhecidos… Talvez a Blaya e eu tenhamos essa responsabilidade, sim!

Histórias – Quando te fiz esta pergunta pensei que ias falar dos Pupilos do Kuduro… Fábio – Também, mas os Pupilos do Kuduro davam espectáculos, faziam animações. As pessoas gostavam de assistir, mas não dançavam. Fizemos muita estrada, mas não pusemos ninguém a dançar.

Histórias – Como surgiram os Pupilos do Kuduro?
Fábio – É uma história engraçada. Surgiram na altura do secundário. Fui a um casamento angolano, com muito Kuduro. Pensava que era o único que sabia dançar, comecei a dar o meu show e um primo afastado, que conheci nesse dia, começou a dançar também! Acabámos por criar uma espécie de competição, uma battle!

No dia seguinte, por acaso, encontrei-o. Andávamos na mesma escola, mas não sabíamos! Uma semana depois, convidou-me para fazer parte do grupo que estava a criar, os Pupilos do Kuduro. Éramos todos da mesma escola e ensaiávamos nos intervalos. Até hoje, creio que foi o único grupo de Kuduro que fazia coreografias do início ao fim das performances.

O Kuduro tem o freestyle como base. Nós fazíamos cerca de seis minutos de coreografia e acredito que marcámos por isso. Havia outros grupos que também o faziam, mas entre 30 a 60 segundos.

Histórias – O Kuduro de hoje é completamente diferente daquele que dançavas em Luanda. Como é que vês essa evolução?
Fábio – É um misto de sentimentos. Evoluiu-se muito, porém há aspetos de que não gosto. O denominado “Kuduro moderno”, criado pelo grupo Pink 2 Toques, é muito rápido, mais do que a própria música. É bom, gosto de ver, mas não me sinto confortável a dançar. Nasci na época do “Kuduro antigo”, que também era rápido, mas dançado ao ritmo da música.

A História de Fábio

Histórias – Estás em Portugal há 17 anos. O que mais recordas de Luanda?
Fábio – É difícil!… Lembro-me bem do sítio onde morava, o bairro Marçal, na periferia de Luanda. Era muito degradado. Recordo-me da minha casa, não sei como consegui viver naquelas condições… Mas vivi e era mesmo muito feliz! E lembro-me das brincadeiras, não havia electricidade e, por isso, íamos todos para a rua, até às 22h00, 23h00.

Histórias – Tens saudades?
Fábio – Muitas! Mas não é aquela saudade de querer voltar. Sinto-me nostálgico quando me lembro desses tempos, da família, dos amigos e de como era feliz. Se me perguntarem se quero voltar, claramente não.

Histórias – Como foi para um miúdo de 13 anos vir viver para Portugal?
Fábio – O meu pai viaja muito, trabalha nas Linhas Aéreas de Angola, e sempre falou de Portugal. Eu era um miúdo que ainda não sabia nada da vida, que estava a tornar-se um jovem, fiquei deslumbrado.

Pensar que ia andar de avião e que vinha para outro país foi uma emoção. Quando cheguei, vi supermercados enormes!… Fiquei de boca aberta, no meu bairro não havia nada parecido!

Além disso, havia uma loja que se chamava Fábio Lucci! FÁBIO Lucci! A loja tinha o meu nome! Achava surreal… E foi fácil fazer amizades, enturmei-me muito bem…

Celebra-se hoje o Dia Mundial da Dança

Histórias – Não danças só Kuduro?
Fábio – Não danço só Kuduro e acho muito importante frisar isso, porque estou rotulado como o Fábio Krayze do Kuduro. Obviamente, danço outros estilos dentro das Danças Urbanas, como Hip Hop, Locking, Popping… Gosto de salientar que sou muito mais do que Kudurista, sou bailarino. Aliás, o Hip Hop influência muito o meu Kuduro.

História – Como vês a evolução das Danças Urbanas em Portugal?
Fábio – Na altura em que comecei nas Danças Urbanas cá em Portugal, o país já estava num patamar muito bom. Faziam-se muitas battles e já existiam excelentes bailarinos.

Com o passar dos anos, Portugal evoluiu ainda mais e, atualmente, tudo o que se faz de bom lá fora, nos EUA, também é feito cá. Além disso, há muita gente a querer fazer Street Dance.

Penso que os programas de televisão ajudaram nesse sentido, porque vieram desmistificar estes estilos, que obviamente não são só para “miúdos de bairro”, são para quem gostar e quiser dançar. Hoje em dia, a comunidade das Danças Urbanas é muito maior e essa é uma das grandes evoluções.

Histórias – Os nossos bailarinos estão ao mesmo nível dos de outros países da Europa ou dos EUA?
Fábio – Não!… Portugal tem bailarinos com muito talento e de muita qualidade, provavelmente até mais do que muitos outros países. Porém, não temos metodologia, nem treino. Não somos rigorosos, somos demasiados descontraídos e um pouco relaxados.

Não tenho dúvidas de que temos qualidade e talento e a grande bailarina Diana Matos, que fez a tour com o Justin Timberlake, é um exemplo disso. Hoje é um nome de referência nos EUA, mas teve de ir para fora.

Não temos o rigor dos países da Europa do Norte, por exemplo. Treinam várias horas por dia, todos os dias, e têm um plano muito bem definido para alcançarem os seus objetivos. É impossível que não se tornem melhores que nós!

Krayze dedica grande parte
do seu tempo aos projetos profissionais

Histórias – Tornaste-te uma figura pública com as participações no programa “Achas que sabes dançar?”, da SIC, e na telenovela “A única mulher”, da TVI. A tua vida mudou muito desde essa altura?
Fábio – Mudou completamente! O “Achas que sabes dançar?” permitiu-me dar “um grande salto”, não só em termos de conhecimento e treino em dança, mas também porque me trouxe muito trabalho. Só parei em 2018!

Tanto o programa, como a novela, entre 2015 e 2016, trouxeram-me muita coisa boa e abriram-me muitas portas. Naquela altura, sentia-me realizado. Sentia que estava num patamar em que já tinha alcançado muita coisa, apesar de saber que ainda havia muito por fazer.

Foi importante, porque tive muito trabalho e vivo, exclusivamente, da dança.

Histórias – O que mais te marcou nessa altura?
Fábio – Com o “Achas que sabes dançar?” ensaiei, durante meses, de terça a domingo, e cresci muito enquanto bailarino. No entanto, depois do programa terminar, não tive tempo para continuar a evoluir, porque tive muito trabalho. Hoje, penso que podia ter aprendido mais e melhorado outros estilos.

Histórias – Voltavas a fazer tudo de novo?
Fábio – Voltava a fazer tudo de novo. Mas, hoje, não voltava a participar.

Histórias – Como é estar em cima de um palco?
Fábio – Não consigo explicar. São muitos sentimentos em simultâneo: medo, euforia, alegria… É inexplicável!

Histórias – É um motivo de ansiedade?
Fábio – Sim! É pensar se vai correr bem. Em quem está a ver… É muita coisa, mas gosto mesmo muito de estar em palco.

Histórias – Também és professor de dança. Como é para ti dar aulas?
Fábio – Ser professor é uma aprendizagem. Não basta saber os passos e a metodologia. É preciso conhecer-me a mim e aos outros e isso leva tempo.

Ou seja, não levo coreografias feitas em casa para as aulas de Kuduro e de Afrohouse, porque não sei quem vou encontrar. Não gosto de terminar uma aula com a sensação que metade dos alunos não acompanhou, sequer, os primeiros oito tempos! Saio triste e frustrado.

Deixei de coreografar em casa, crio apenas uma base e vou construindo na sala de aula, porque vou percebendo as dificuldades. Isto leva tempo e é por isso que digo que ser professor não é fácil.

Por outro lado, é muito gratificante, pela visível evolução dos alunos e pelas palavras que alguns me dizem. Ao início, passei por uma fase em que não me apetecia dar aulas. Agora gosto e sei que é isto que quero fazer diariamente.

Histórias – Que estilos dás?
Fábio –
Neste momento, Hip Hop, na minha escola, a KRZESchool, e Kuduro, na Jazzy Dance Studios.

Fábio e Iara Núria

Histórias – Fala-nos da KRZESchool.
Fábio – Criei a KRZESchool, oficialmente há três anos, com a minha irmã, Iara Núria. Situa-se em Rio de Mouro. Há muito tempo que tinha este projeto em mente, porque sempre quis ter uma escola de dança, para poder continuar a trabalhar na área, quando já não puder dar aulas. Ninguém melhor do que a Iara para entrar neste projeto comigo.

Quando começámos tínhamos apenas um aluno! Atualmente, temos cerca de 80 e, cada vez, mais estilos: Ballet, Contemporâneo, Salsa e vários níveis de Hip Hip. Dentro de pouco tempo, vamos abrir mais aulas.

Histórias – Não há Kuduro?
Fábio – Não. Talvez abra uma aula de AfroKuduro, em 2020. Até agora, não quis ter Kuduro, precisamente devido ao tal rótulo que me puseram. Quis mostrar que sei dançar outros estilos, dou aulas de Hip Hop.

Histórias – E o Krayze Show, que projeto é este?
Fábio – Nasceu em 2018. Sempre gostei de cantar, mas só comecei a apostar nesta área desde o ano passado. Até então não tive tempo, nem me sentia à vontade. E ainda não sinto, fico um pouco envergonhado.

Duas pessoas que vieram da Eslovénia, que faziam as minhas aulas, gostaram das músicas e incentivaram-me a juntar o canto e a dança e a criar o projeto. Senti-me motivado e decidi apostar no Krayze Show, com músicas originais e muita dança.

Krayze Show: Guilherme Brak-Lamy, Igor Lima, Anisa Kete, Kaja Besednjak e Fábio

Atuámos no Rock in Rio Lisboa, em colaboração com a Jazzy Dance Studios, no Meo Sudoeste, e no O Sol da Caparica, em colaboração com a A Showit Dance Academy. Foi muito bom.

Histórias – Tens um álbum com as músicas do Krayze Show?
Fábio – Não, é um EP. Quando marcámos os festivais, tinha muito poucas músicas, e gravei o “2018 or Nothing”, com seis músicas.

2018 foi o ano em que investi na música para perceber se era realmente o que queria. O título do EP significa que iria passar a dedicar-me apenas à dança, caso este trabalho não seguisse em frente.

Histórias – Depois disto, consideras-te mais músico ou bailarino?
Fábio – Bailarino, claramente! Vou ser sempre bailarino, mas gostava muito de ser cantor.

Histórias – Tens uma “marca” de roupa…
Fábio – Tenho, a KRZE. É uma marca que me define, representa diversão e energia. Neste momento, estou a recriá-la e a associá-la à KRZESchool. Vêm aí coisas boas!

Histórias – Como é que se pode adquirir?
Fábio – Através do Instagram da KRZE ou pelo meu Facebook.

Histórias – Com tantos projetos, como é que geres o teu tempo?
Fábio – Não sei! A minha vida está toda virada para os projetos. De facto, não tenho tempo nenhum para mim… Esta pergunta fez-me, agora, pensar nisso!

Histórias – Como é que te vês daqui a 20 anos?
Fábio –
20 anos é muito tempo! Quero fazer muito mais música e continuar a dançar e a construir a minha escola, que é um trabalho que nunca acaba. Pessoalmente… Quero ser feliz!

Workshop de Afrohouse

Nota: as fotografias foram tiradas do Facebook de Fábio Krayze.

Portugal celebra Dia Mundial da Dança

O Dia Mundial da Dança celebra-se a 29 de abril 

O Dia Mundial da Dança vai ser celebrado em todo o país com várias com atividades, entre espetáculos, aulas e oficinas, para profissionais da área e para o público em geral. O objetivo é de festejar uma arte cuja universalidade é destacada por instituições internacionais como o Comité Internacional da Dança (CID).

O Dia Mundial da Dança foi instituído pelo CID da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) em 1982. É celebrado na data de nascimento do bailarino, mestre de bailado e autor da obra teórica “Lettres sur la Danse”, Jean-Georges Noverre (1727-1810), considerado um dos pioneiros da dança moderna.

A Companhia Nacional de Bailado (CNB) vai celebrar a data com uma programação de espetáculos e atividades em quatro cidades, em simultâneo: Aveiro, Leiria, Lisboa e Faro.

Em Lisboa, no Teatro Camões, a CNB apresentará um programa inédito que pretende dar a conhecer ao público os bastidores da companhia, com visitas guiadas a partir das 15h00, e a possibilidade de assistir a uma aula dos bailarinos, às 19h00.

De acordo com a CNB, depois da aula dos bailarinos, a ter lugar no palco do teatro, serão realizados ensaios comentados de duas novas criações: “Annette, Adele e Lee”, e “Madrugada”, dos coreógrafos Rui Lopes Graça e Victor Hugo Pontes, respetivamente.

As celebrações da CNB estendem-se, no mesmo dia, a Aveiro, onde a companhia apresentará o espetáculo “A Perna Esquerda de Tchaikovski”, de autoria de Tiago Rodrigues, e que conta com a interpretação da bailarina Barbora Hruskova e do pianista Mário Laginha, também autor da música original deste espetáculo.

No âmbito de um trabalho que tem vindo a desenvolver junto das escolas de dança em Portugal, a CNB irá também promover uma masterclasses de técnica de dança clássica em Aveiro, Leiria e Faro.

No Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, o coreógrafo norte-americano Merce Cunningham (1919-2009) vai ser alvo de um espetáculo de homenagem, nos 100 anos do seu nascimento.

De acordo com a programação do Centro Cultural Vila Flor, a data será assinalada com o espetáculo “Not a moment too soon”, solo interpretado por Trevor Carlson, o último diretor da companhia de Cunningham.

Considerado um dos criadores que mudaram os rumos da dança moderna, Merce Cunningham criou mais de 200 coreografias e entre os seus colaboradores figuraram John Cage, Jasper Johns, Andy Warhol e Robert Rauschenberg.

No mês em que se celebram os 100 anos do seu nascimento, o Centro Cultural Vila Flor está a realizar desde segunda-feira – culminando com o espectáculo de dia 29 de abril – uma programação especial que inclui formação para escolas de dança, um ensaio aberto do espectáculo, uma conversa com Trevor Carlson, e a projeção de filmes feitos pelo coreógrafo nos últimos anos de vida.

Também a Companhia de Dança de Almada está a apresentar um programa de espetáculos e atividades a decorrer desde sexta-feira, que se prolongam até 3 de maio para assinalar o Dia Mundial da Dança.

Hoje, a Companhia de Dança de Almada estreia um programa composto por duas novas criações: “Qu’ils mangent de la brioche: #publicperception”, coreografado por Luís Malaquias com base na história de Maria Antonieta, rainha francesa guilhotinada durante a Revolução Francesa, numa decisão do tribunal revolucionário que marcou a história do país.

Vai ser também apresentada uma criação resultante de uma residência artística da coreógrafa sueca Julia Ehrstrand, com título ainda por anunciar.

No próprio Dia Mundial de Dança, a 29 de abril, segunda-feira, no Cine Teatro Sede da Academia Almadense, realiza-se uma sessão comemorativa para reflexão sobre o impacto das atividades da Companhia de Dança de Almada (Ca.DA) ao longo de quase 30 anos de trabalho na cidade, com a presença da fundadora e diretora, Maria Franco.

Nesta sessão serão apresentados alguns vídeos sobre o trabalho da companhia e extratos coreográficos ao vivo.

A terminar o programa, a 3 e 4 de maio, a Ca.DA apresenta “Óptima”, um espectáculo resultante do projeto coreográfico, criação da professora e coreógrafa Maria José Bernardino.

Em Torres Novas, o Dia Mundial da Dança será assinalado no domingo e na segunda-feira: no dia 28, com uma demonstração da escola o Corpo da Dança, às 15h00, na Praça 5 de Outubro, e às 16h00, na Praça do Peixe, uma demonstração de dança e expressão corporal a cargo da Fácil Contacto.

Na segunda-feira, 29 de abril, a autarquia desafiou duas instituições do concelho – a Escola de Dança Rita Assis e O Corpo da Dança de Marta Tomé – para, através de dois percursos diferentes pelas ruas da cidade, realizarem apontamentos artísticos, entre as 17h00 e as 19h00.

Histórias de Encantar… ou não vai assinalar este Dia Mundial da Dança com a publicação de uma entrevista ao bailarino Fábio Krayze

Catchupa d’Terra: a cultura de Cabo Verde em Portugal

A 10.ª edição do Catchupa d’Terra realiza-se já no próximo dia 17 de novembro, no Barrio Latino, em Lisboa.

Catchupa d’Terra é um evento desenhado e pensado por pessoas completamente apaixonadas pela cultura cabo-verdiana, para quem partilha deste mesmo gosto ou quer conhecer melhor as coisas boas que são criadas nas 10 ilhas vulcânicas da região central do Oceano Atlântico, a uns quantos quilómetros da costa da África Ocidental.

O ambiente é familiar, doce e acolhedor. Durante o jantar – de cachupa, tal como o nome faz entender -, ouvem-se agradáveis músicas tradicionais deste arquipélago. As pessoas convivem, fazem amigos e ainda têm oportunidade de ouvir um contador de histórias, algo tão usual em Cabo Verde de outrora e que agora volta a estar na moda.

Os organizadores e toda a sua equipa são disponíveis e focados em dar atenção aos clientes, para que todos se sintam acolhidos e confortáveis. Depois de tudo isto, começa o baile… e com direito a animação!

Em suma, Catchupa d’Terra é definida pelos seus organizadores, Waty Barbosa e Miguel Magalhães, como um evento que visa promover a cultura cabo-verdiana, nas vertentes da gastronomia, música e dança. Waty Barbosa está responsável pela cachupa rica e pelas sobremesas tão típicas da terra onde nasceu. A animação durante o baile está também a seu cargo.

Miguel Magalhães é responsável por toda a logística do evento e, sendo também o seu DJ residente, por toda a música que é passada durante o jantar (sobretudo, Morna e Coladeira), a festa (com clássicos de Coladeira, Kizomba, nos seus diferentes estilos, como seja Cabo Love, Cabo Retro e Cabo Zouk, e Funaná tradicional) e as animações de grupo (Funaná, Kola San Jon e Afrohouse, um ritmo de Angola).

O próximo Catchupa d’Terra vai realizar-se já no dia 17 de novembro, no Barrio Latino, em Lisboa, somando a assim a sua 10.ª edição. O preço dos bilhetes, que podem ser adquiridos aqui, é de 20 euros.

Um projeto com história e em crescimento

Um é cabo-verdiano, o outro português, ambos têm 41 anos e foi o gosto em comum pela kizomba e pela cachupa que os tornou amigos e mais tarde sócios – com a criação do Catchupa d’Terra, que assim que possível, será ainda mais do que um jantar seguido de festa.

Ambos consideram que juntos fazem a parceria ideal para a realização deste evento. “Cada um tem o seu conjunto de saberes, que não coincidem e, por isso, não há motivos de discussão. Completamo-nos!”, afirma Miguel Magalhães.

Sempre pensaram no Catchupa d’Terra como um evento cultural, onde iriam dar a conhecer a gastronomia, a música e a dança de Cabo Verde, no formato de jantar, seguido de festa. Contudo, o gosto e a vontade de partilha de tudo aquilo que é criado em Cabo Verde são tão grandes que, com a construção do site, feito com o objetivo de gerir a venda de bilhetes para o evento, surgiu também a ideia de usar a marca Catchupa d’Terra para desenvolver um espaço na Internet com informação acerca desta cultura.

“Um dos projetos que tenho, e que pelo que sei ainda não existe, é a criação de um dicionário de Crioulo cabo-verdiano/Português, Português/Crioulo cabo-verdiano. Além disso, existe a vontade de dar a conhecer outro tipo de personalidades, como pintores, artistas plásticos, escritores…”, enumera Miguel Magalhães. E avança: “Esta parte ainda não está posta em prática, mas está em projeto para completarmos aquilo que é a marca Catchupa d’Terra.”

Tudo começou, em 2013, numa aula de kizomba. Miguel era aluno de outro professor, que, na altura, precisou de se ausentar por uns dias. Waty Barbosa foi substituir o colega.

“Gostei logo da abordagem do Prof. Waty Barbosa, criei empatia, fui procurá-lo na academia em que dava aulas e passei a ser seu aluno”, recorda Miguel.

Na época, Waty explorava um bar em Santos, onde, todas as sextas-feiras, fazia cachupa. Miguel passou a frequentar e a dar a conhecer o espaço e, especialmente, o prato a vários amigos. “A Catchupa d’Terra vem muito do talento do Waty também como cozinheiro. Se a cachupa dele é diferente de todas as outras, para melhor, porque não aproveitar isso para dar a conhecer a gastronomia de Cabo Verde?!.”

Nestes “convívios de cachupa”, às sextas-feiras, fizeram-se muitos amigos. Waty e Miguel criaram uma grande amizade, tornando-se, mais tarde, sócios. “Por vezes, o Miguel dizia-me que tínhamos de fazer uma festa de cachupa e foi daí que surgiu a ideia”, lembra Waty.

Um dia, o professor de kizomba pediu ajuda a Miguel para organizar um evento solidário para a sua parceira de dança, que estava a passar por um problema grave de saúde. “O nosso primeiro evento não tinha nome, chamamos-lhe apenas jantar solidário. Correu bem, as pessoas gostaram, ficámos com uma ideia do trabalho que dá e com alguma experiência e resolvemos criar o Catchupa d’Terra”, conta Waty.

Waty Barbosa em Portugal há 20 anos

Professor de danças tradicionais de Cabo Verde, Waty Barbosa nasceu na Ilha de São Vicente. A sua mãe é da Ilha de São Nicolau e o pai da Ilha do Fogo. Aos 21 anos de idade, Waty Barbosa veio a Portugal, gostou e cá ficou. Faz 20 anos!

“A maioria dos cabo-verdianos crescem com a ideia de sair de Cabo Verde, de emigrar para ter uma vida melhor e ajudar a família que fica. Eu fui, mais ou menos, apanhado nessa onda”, diz Waty Barbosa. Mas acrescenta que, na realidade, o que o trouxe a Portugal foi a dança.

“Eu tinha um grupo multicultural de teatro e dança, que foi convidado para fazer animação no pavilhão de Cabo Verde, na Expo 98, e ainda num outro evento, com a duração de um mês, com o Grupo Preto no Branco, de Montemor-o-Velho, que já tinha estado em Cabo Verde”, recorda. E afirma: “Estive nessas ‘duas frentes’ e como tinha tios a viver em Peniche, resolvi ficar. Três meses depois mudei-me para Lisboa.”

Afirma ter gostado de Portugal. Caso contrário não teria ficado até hoje. Contudo, sentiu a diferença cultural. “É uma mudança que se sente, mas com 21 anos não se pensa muito nessas coisas. Estava a viver outra realidade e a gostar da experiência, por isso não foi muito difícil”, conta, confessando que, obviamente, tinha saudades da mãe e da sua comida, da família e dos amigos. “É por isso que usamos tanto a palavra ‘sodad’! Tive de me adaptar, demorou, mas habituei-me a viver a realidade de Lisboa.”

Atualmente, está mais dedicado ao seu trabalho na área da construção, razão pela qual dá cada vez menos aulas de dança. Contudo, e porque é algo que não quer deixar totalmente, vai dando umas aulas pontuais e participando em festivais. “Não quero parar, gosto de dar o meu contributo, de ajudar a ensinar às pessoas aquilo que considero que se deve saber para dançar socialmente”, indica.

Miguel Magalhães: um apaixonado por Cabo Verde

Miguel Magalhães nasceu e sempre viveu em Portugal. Não sabe de onde vem este seu gosto pela cultura Africana, sobretudo pela de Cabo Verde, mas acredita que o facto de a sua mãe ter nascido em Moçambique e de muita da sua família ter vivido em África possa ter influência.

“Talvez ter crescido a ouvir muitas histórias da minha família que emigrou para vários países de África, de ouvir música africana e de ver fotografias tenham criado em mim a simpatia que tenho pelo continente”, observa.

Enquanto DJ e apreciador de música, Miguel Magalhães recorda que começou a ouvir as primeiras kizombas cabo-verdianas, por volta do ano de 1998. Porém, naquela altura, não sabia a sua proveniência. “Agora, que sou conhecedor dos estilos e subgéneros, apercebo-me que as kizombas que gostava eram as de Cabo Verde”, diz. E desenvolve: “Normalmente são músicas mais românticas e, além disso, sou um apaixonado pelo crioulo. Acho que é um dialeto muito doce.”

Além de DJ, Miguel Magalhães trabalha em eventos, na área dos audiovisuais. E tem vindo a formar-se na área do Marketing Digital e da produção e organização de eventos.

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Kaizen Dance: a engenharia (interna) das emoções

Foi com muita simpatia, um sorriso grande e brilhante e uma serenidade contagiante que fui recebida pelo bailarino Kwenda Lima, no Art Kaizen, em Lisboa, o espaço que criou, há cerca de um ano, e que define como “um templo de arte para o equilíbrio interno, através de engenharia interna Kaizen”.

Depois de me dar a conhecer este seu tão acolhedor espaço – com zonas próprias para meditar, socializar, dançar e todo ele decorado com símbolos das várias religiões e culturas, de forma a levar as pessoas a conhecer-se e a respeitar-se nas suas diferenças, crenças e filosofias -, Kwenda Lima falou-me do Kaizen Dance, que criou em 2003, do Art Kaizen, de si e da sua forma de estar na vida.

Kwenda nasceu há 40 anos, em Cabo Verde, e, desde que se recorda, sempre foi muito ligado à dança, à arte e à terra. Mais tarde, veio para Lisboa, onde se formou em Engenharia Aeroespacial, no Instituto Superior Técnico, tendo ido depois para Londres, onde fez o seu doutoramento. Apesar de ter sido esta a área que escolheu para trabalhar, o gosto pela arte, pela dança, pela meditação e pelo (seu e dos outros) bem-estar interior falaram mais alto, acabando Kwenda por dedicar-se à, como lhe chama, “engenharia interior”, criando e desenvolvendo o Kaizen Dance.

“O Kaizen é uma filosofia, uma maneira de estar na vida. Por vezes, chamo-lhe de tecnologia, por ser algo de que gosto muito e que desenvolvemos para nosso comodismo, para que funcione”, afirma. E acrescenta: “O Kaizen Dance vai precisamente no sentido de criar esse comodismo, mas de forma a irmos buscá-lo internamente, não apenas no exterior. É uma forma de viver a vida, cultivando-nos com responsabilidade.”

Kaizen é uma palavra japonesa, muito utilizada pelas empresas, que significa “algo que está em constante evolução”. A Dança Kaizen, uma espécie de meditação ativa, com inspiração em vários estilos de dança, de ritmos, de culturas e de religiões.

Aceitar a vida de forma simples

Estávamos sentados no chão, numa bege e felpuda carpete, num espaço acolhedor e com muitos livros, uma cadeira suspensa de teto e pequenos e confortáveis sofás, enquanto Kwenda me falava do Kaizen Dance. Ouvindo atentamente tudo o que me disse, tive de lhe perguntar como surgiu a ideia de criar este estilo de dança/meditação e em que é que se inspirou.

“Não foi algo pensado! Surgiu de uma sequência de informações e situações. Foi tudo muito natural, depois de lhe ter dado um nome, de o criar, cheguei à conclusão que já estava a fazê-lo antes!”

Contudo, e segundo conta, o que o levou a desenvolver o Kaizen Dance foi o facto de perceber que muitas das pessoas que iam dançar, procuravam algo que não era bem a dança. “Há qualquer coisa por trás dessa busca, o movimento acaba por esconder e disfarçar um pouco isso. Porém, entendi que as pessoas procuravam algo que lhes faltava internamente. Mais profundo, delicado e inconsciente. Foi isso que me levou a desenvolver este trabalho através da dança e por gostar de dançar”, afirma.

E desenvolve: “Com o Kaizen procuro levar as pessoas a descobrir e a valorizar as suas próprias ferramentas, a terem essa consciência e a fazer com que aceitem a vida de uma forma simples.”

Os objetivos de Kwenda Lima, em cada aula de Kaizen Dance, dependem do grupo com que está a trabalhar: “Cada corpo é um corpo e tem as suas memórias. Até chegarmos a essa informação, até preparamos o corpo – como a terra para receber a semente – é preciso passar por vários processos.”

No final de cada aula, com diversos ritmos, movimentos e exercícios. Depois de cansarem o corpo e a mente, as pessoas “serenam” e Kwenda passa a sua mensagem, que pode ser sobre a coragem, o medo, o medo de dar e de receber, o egocentrismo, o dinheiro, entre outros.

“Notas diferença nas pessoas passado algum tempo?”, pergunto. “Noto muita, mas vêm também falar-me emocionalmente e dizem-me. Não é um trabalho em que se veja uma diferença palpável, mas sim que se sente e em que há continuidade”, responde.

E diz: “É como se estivéssemos a trabalhar a terra. Depois de lhe deitarmos água, deixa de estar seca e dura, passa a estar macia e, ai, podemos pôr a semente e ela vai brotar. Leva algum tempo até chegarmos a esse ponto.”

Art Kaizen: o sonho que Kwenda tornou realidade

Como já referi, Kwenda Lima criou o Art Kaizen, que se situa na zona de Beato, em Lisboa, há um ano. Contudo, este é um sonho antigo, com mais de 10 anos. “É o tentar materializar a forma como vejo a dança e a vida.”

Aqui são dadas aulas regulares de Kaizen Dance, Kizomba, Afro-Contemporâneo, Yoga, Capoeira e Danças Africanas. Além disso, têm também cursos de Afro-cubano, Mudjeris di Terra – um encontro quinzenal de mulheres -, entre outros.

“O projeto Art Kaizen está a correr muito bem. Está a crescer devagar, mas está a seguir um bom caminho, aquele em que as suas raízes ficam fortes”, afirma Kwenda Lima. E continua: “Nunca gostei de avançar muito rápido. Adoro o Bambu precisamente por isso. Cresce de forma muito lenta, mas forte. Depois há um crescimento muito rápido, ele está forte e resiste a qualquer coisa.”

Kwenda aplica isto em tudo o que faz e o Art Kaizen é um desses seus ramos. “Está a crescer, mas com consciência. Não quero que seja uma escola de dança, mas um espaço de cultura, de união, de ligação, onde as pessoas se conhecem e se respeitam.”

Kwenda Lima e a sua filosofia de vida

Histórias – É gratificante perceber que fazes a diferença na vida das pessoas? Sentes que estás a “cumprir a tua missão/propósito de vida”?
Kwenda –
Nunca penso em “cumprir uma missão”. Nunca comecei por pensar num propósito de vida, acho que, em primeiro lugar, devemos deixar “a flor nascer”. Cuidar das suas raízes e fazer com que a planta seja saudável. De certeza, que a sua flor vai aparecer.

Nunca pensei na flor antes da planta. Vou vivendo as flores. Se me sentir satisfeito e se isso significa que alcancei o meu propósito de vida… então, sim! Não penso nisso, mas sim no meu bem-estar. No facto de que tudo aquilo que eu esteja a fazer,  contribua para o exterior e que seja um trabalho em paralelo para o meu próprio enraizamento e consciência.

É esse equilíbrio que me faz sentir que a vida é simples, boa de se viver.

Histórias – Colocas em prática todos os conselhos que dás?
Kwenda –
Não posso, nem quero, falar de uma teoria sem a experienciar. Para mim, o importante é eu viver, saber quem é esta máquina, para depois poder partilhar. Dar às pessoas, não a possibilidade de resolverem a sua vida, mas de tentarem descomplicá-la. Para mim não faz sentido falar de algo que não sinto ou não senti.

Histórias – Como é que um engenheiro aeroespacial veio aqui parar?
Kwenda –
Sempre tive estes dois mundos em paralelo – a dança e a engenharia. Sempre gostei muito de tecnologias e adoro aviões. É fascinante saber que o homem consegue construir uma máquina daquelas, que faz a ligação de uma ponta à outra do mundo, intercâmbios culturais.

Existem muitos engenheiros, é muito fácil viver socialmente de engenharia, mas faltava-me alguma coisa. A ligação com a arte. Gosto de relacionar as coisas e para mim faz sentido ligar a religião, à arte e à ciência. São três pilares muito importantes na sociedade.

Estando na dança consegui encontrar essa ligação. Além disso, enche-me o coração e, ainda, viajo e estou com muitas pessoas. Preenche-me muito mais, por isso não foi difícil seguir por este caminho.

Histórias – Nem sentes saudades?
Kwenda –
Não! Às vezes sinto saudade de estudar, dos computadores… mas não dura muito tempo! A engenharia passa por criar um conforto externo, fazendo uma casa, um carro, um avião, um computador… Permitir-nos ter uma vida mais fácil, utilizando o Kaizen, para mim é trazer a engenharia para a dança! Se eu consigo criar conforto externo, porque não hei-de criar também interno?

Desta forma, sou engenheiro das minhas próprias emoções, da minha forma de estar na vida, de aceitar, de fazer com que determinada reação/situação não tenha um impacto tão forte em mim. De perceber porque é que eu sou assim, porque é que certas coisas me atingem, porque é que eu permito. Tudo isto é uma tecnologia, uma programação e eu adoro. A nossa máquina é das mais complexas do mundo e entende-la é um desafio interessante.

A minha primeira aula de Pole Dance

Já passavam uns minutos das 18h00, saí atribulada do trabalho, fui em passo acelerado até ao carro, que ainda estava longe, e segui em direção ao Clube Ferroviário. A aula era às 18h30 e não queria, por nada, chegar mais tarde! Era a minha primeira aula de Pole Dance…

Sim, finalmente fiz uma aula experimental de Pole Dance e devo agradecê-lo à instrutora Joana Silva, que teve a excelente iniciativa de me a oferecer, tal como a alguns leitores do Histórias de encantar… ou não!

Confesso que, até há poucas semanas, não tinha pensado experimentar! Amo dançar, mas quanto ao Pole Dance – apesar de sempre ter gostado de ver as performances, de achar lindo e “espetacular” – sempre achei que não era para mim. Pensei ser até impossível.

Se não tenho grandes problemas em termos de flexibilidade, no que diz respeito à força já não posso afirmar o mesmo. Porém, depois desta sessão percebi que não há impossíveis!

Obviamente, que fiz praticamente nada, mas entendi que apesar de não ser fácil, como já suspeitava, tudo é feito de uma forma muito gradual, com calma e com a ajuda da Joana.

Quando finalmente cheguei ao Clube Ferroviário, subi – com duas “colegas” que chegaram em simultâneo – até ao primeiro andar, onde se ia realizar a aula. Joana Silva recebeu-nos muito calmamente.

O espaço é grande, com muita luz natural. Preparámo-nos e sentámo-nos nos colchões a conversar com a nossa anfitriã, que queria saber que tipo de contacto tínhamos com o Pole Dance e o que nos levara até ali.

Passámos depois ao aquecimento, com exercícios de flexibilidade e de força – o meu calcanhar de Aquiles! E, de seguida, veio o tão esperado e, até engraçado, momento do varão. Os exercícios foram simples, os movimentos bonitos e femininos. Adorei! A Joana explicou tudo com muita calma e esteve sempre atenta e pronta a ajudar cada uma de nós.

Entre piadas e trocadilhos e enquanto nos íamos rindo de nós mesmas, acabámos por fazer todos os exercícios – a nossa dança do varão – e aquela 1h15 de aula passou num ápice!

A partir de agora o meu objetivo é muito simples: desafiar as leis da gravidade com a minha super força, fazer maravilhosas acrobacias, com a excelente flexibilidade que tenho, movimentos sensuais e flutuar, tal como a Joana Silva!… Sempre fui uma pessoa contida nos meus sonhos!

Muito obrigada à Joana pela entrevista e por esta oportunidade e a quem esteve, ontem, na aula. Grata também a todos os que participaram no passatempo.

Lê a entrevista a Joana Silva, pole dancer e instrutora de Pole Dance.

Joana Silva: “Pole Dance é para todos… É para quem gosta”

Entre a barulheira da criançada que por ali brincava e a ventania repentina que se fazia sentir, sentadas num banco de jardim, conversávamos sobre Pole Dance. Encolhida dentro do seu casaco de ganga, como quem se defende do vento, Joana Silva não conseguia esconder o deslumbramento que sente por esta dança e pela sua profissão, às quais tanto se tem dedicado e muito a “preenchem”. Os olhos brilhavam.

Pole dancer e instrutora de Pole Dance, desde 2008, Joana Silva diz que, ao longo dos anos, a dança tem sido alvo de grande desenvolvimento, tanto a nível técnico, como de estilo. “Dentro do Pole Dance não há apenas aquele estilo sensual, que é o mais conhecido, existem muitos outros”, explica.

E continua: “Gosto de o definir como uma dança com uma componente técnica muito grande, onde se utiliza o varão para executar acrobacias ou para dançar. Tal como qualquer outra dança, é uma forma de expressão.”

Ouvindo isto, tive de perguntar-lhe se considera que o estigma inicialmente existente em torno do Pole Dance – apenas associado à sensualidade, ao erotismo, aos bares de strip, entre outros – já foi ultrapassado. Joana responde que não!

“Ainda existe, tanto em Portugal como em outros países desenvolvidos, e vai continuar durante muitos anos. No fundo, este estereótipo existe por falta de conhecimento, porque as pessoas continuam muito vinculadas à ideia de que o Pole Dance veio dos strip clubs. Efetivamente, faz parte da história em termos de evolução da dança, que é já muito mais que isso. Existem inúmeros estilos”, explica.

Para combater esta ideia, a comunidade de Pole Dance tem vindo a organizar e a desenvolver projetos – desde competições, espectáculos e exposição nos media – com o objetivo de dar a conhecer e de explicar a dança à população.

Em Portugal, o Pole Dance tem “vindo a desenvolver-se muito bem”. Há cada vez mais escolas e pessoas a praticar. Realizou-se, durante três anos, um Espetáculo Nacional de Pole Dance, criado por Joana Silva e outra pessoa, e foi criada, recentemente, a Associação Portuguesa de Varão Desportivo.

Força, flexibilidade, treino e dedicação

Acrobata desde criança, aparentemente franzina e delicada, 37 anos, nas suas performances Joana demonstra ter a “força de mil homens” para se manter pendurada no varão, enquanto dança ou executa acrobacias, tal como uma flexibilidade indiscutível. Sem tremer. Sem aparente dificuldade. Como quem flutua.

Como professora e apaixonada que é por este estilo de dança, Joana afirma que, mesmo não sendo fácil, o Pole Dance pode ser praticado por qualquer pessoa, de ambos os sexos, de qualquer idade e com qualquer tipo de corpo. Basta que goste, que treine e que se dedique.

“A evolução depende de cada um, do background que possa ou não ter, do número de dias que treina, da dedicação e da capacidade de aprendizagem, que não é igual em ninguém. Não existe uma fórmula”, diz a bailarina.

E acrescenta: “É um pouco mais exigente que outra dança, porque tem uma componente técnica que requer mais força e mais flexibilidade, mas tudo é possível.”

Como qualquer outro estilo ou outra atividade física, também o Pole Dance traz inúmeros benefícios para a saúde. A nível físico trabalha muito os membros superiores e o core. Contudo, obviamente que são também usadas as pernas e que os resultados são visíveis.

Joana Silva considera que as mais-valias desta dança são ainda maiores e mais visíveis quando falamos em termos psicológicos. “À medida que vão conseguindo conquistar cada desafio, cada novo movimento e acrobacia, as pessoas sentem cada vez mais autossatisfação, autoestima e autoconfiança, o que traz muitos benefícios a nível pessoal e emocional”, menciona.

E explica que, em todas as aulas, durante o aquecimento, são feitos exercícios de condição física, que envolve treino de força, alongamentos, coordenação, treino respiratório, entre outros.

As aulas em si têm uma componente de condição física para preparar os alunos para a técnica do varão. No entanto, existe também uma aula específica só para condição física para o Pole Dance.

A história de Joana
“Experimentei uma aula. Apaixonei-me, mantive-me e dediquei-me”

Histórias – Qual o espaço que o Pole Dance ocupa na tua vida?
Joana –
Neste momento, é quase total. Tenho outras profissões, sou maquilhadora, fisioterapeuta e estudei Osteopatia. Contudo, estou dedicada, praticamente a 100%, à instrução de Pole Dance, tanto em Portugal, como no estrangeiro. Sou, cada vez mais, requisitada para ensinar lá fora.

A nível pessoal, enquanto pole dancer, também despendo de muito tempo, porque estou no ativo e em competições. Ou seja, treino três horas por dia, tenho dois de descanso, e dou aulas, o que implica também um trabalho de organização, preparação e planeamento. Tenho os dias bem ocupados!

Histórias – Fala-nos um pouco do teu percurso profissional enquanto bailarina e ginasta.
Joana – Sempre fui um bicho irrequieto! Gosto de me mexer, de tudo o que é prático e envolva o corpo. Comecei por fazer ginástica acrobática e fui atleta de alta competição, durante seis anos. Depois, decidi parar porque, na altura, entre estudar e treinar não tinha vida pessoal.

Senti falta de me mexer e resolvi ir dançar. Comecei a fazer vários estilos de Street Dance, entre Break Dance, New Style e House Dance. Gostava e fazia um pouco de tudo.

Sempre tive curiosidade em experimentar Pole Dance, porque vi o filme “Striptease”, com a Demi Moore, que ficou gravado na minha cabeça. Na altura, era nova e não fui logo fazer uma aula, nem creio que houvesse. Quando achei que era a altura certa, fui. Tinha 27 anos. Foi paixão à primeira vista, porque combinava as duas componentes que eu já gostava muito – a acrobática e a dança. Acabei por ir deixando tudo e por me dedicar ao Pole Dance.

Histórias – Foste campeã nacional de ginástica acrobática?
Joana – Sim, quase todos os anos! E fui selecionada para campeonatos da Europa e do mundo. Fiz parte da Federação Portuguesa de Trampolins e Desportos Acrobáticos e da selecção nacional.

Histórias – Também participas em competições internacionais de Pole Dance. Tens de te preparar muito?
 Joana – Sim. Não só a nível físico, como também psicológico e conceptual. O físico exige muitas horas de treino. O psicológico, porque no fundo trata-se de uma “batalha” e, acima de tudo, temos de ser fortes. É preciso abdicar de muita coisa, de muito tempo, de vida pessoal.

A nível de competição, nenhum desporto é fácil. É muito exigente, quando achamos que não dá mais, somos obrigados a levar o nosso corpo ao limite. É preciso estar psicologicamente preparado.

Em termos conceptuais já entra um pouco naquele que é o meu estilo e ao qual me estou a dedicar dentro do Pole Dance. Estou a desenvolver um estilo mais experimental e conceptual.

Quando crio uma performance para apresentar numa competição parto de um conceito, de uma ideia, de um sentimento. Tal como pintar um quadro. Há sempre uma intenção por trás. E para chegar a um conceito forte, que me diga algo e que eu queira expressar, preciso de fazer muita pesquisa.

História – Como é que tudo isto aconteceu na tua vida? O que querias ser quando crescesses?
Joana – Quando era criança não dizia que queria ser Pole Dancer! Curiosamente, queria ser botânica!

Mais tarde, quando andava na ginástica lesionei-me, fui tratada por um fisioterapeuta, gostei do seu trabalho e resolvi estudar Fisioterapia. Nunca pensei ser pole dancer e, muito menos, instrutora. Foi um processo muito natural! Fui experimentar, apaixonei-me, mantive-me e dediquei-me. Depois recebi um convite para dar aulas…

Hoje em dia, depois de ter estudado tanta coisa, acho que esta é mesmo a minha vocação! Adoro ensinar e descobri isso por acaso, ao dar aulas. Já sou instrutora há 10 anos e continuo a sentir-me realizada. Enquanto pole dancer também continuo a adorar. Preenche-me.

Histórias – Projetos futuros?
Joana – Quero participar em outra competição – estou na fase da elaboração do conceito – e continuar a dar aulas a nível nacional e internacional. Ter um pé em Portugal e outro lá fora.

Estou também a desenvolver um curso para instrutores de Pole Dance. Quero passar aquilo que sei e que desenvolvi ao longo de 10 anos a outros instrutores. Já comecei no Egipto, mas é um projeto que estou ainda a desenvolver.

aqui o conceito desta apresentação e o que levou Joana Silva a construí-lo e desenvolvê-lo

Joana Silva começa a dar aulas, já este mês, no Clube Ferroviário, em Lisboa. Para mais informações, contactar joannasilvaa@hotmail.com.

“Histórias de Encantar… ou não” vai sortear uma aula de Pole Dance, com a Joana, que se irá realizar dia 10 de setembro, pelas 18h30. Sabe mais aqui.

Fotografias de Pedro Silva

Pole Dance: habilita-te a ganhar uma aula experimental

“Estou a desenvolver um estilo mais experimental e conceptual dentro do Pole Dance. Quando crio uma performance parto de um conceito, de uma ideia, de um sentimento. Tal como pintar um quadro”. Quem o disse foi Joana Silva, pole dancer e instrutora de Pole Dance, no Clube Ferroviário, em entrevista ao Histórias de Encantar… ou não.

Nesta performance, a artista representa o processo de germinação de uma semente. “Sempre gostei de plantas e de tudo o que está ligado à terra. Fiz experiências com a germinação de vários tipos de sementes. Achei curioso o movimento e o pulsar – não visto a olho nu – e resolvi representá-los com o movimento do meu corpo”.

Joana Silva começa em cima do varão, reproduz a queda da semente, desloca-se pelo chão representando a forma de propagação da espécie e, por fim, em outro varão, mostra o crescimento de uma nova árvore.

Não percas esta entrevista, já nos próximos dias, e participa no nosso PASSATEMPO. Vai ser sorteada uma aula experimental com Joana Silva, já no próximo dia 10 de setembro.

Mais informações muito em breve!

Camila e Enrique: Paixão e dedicação ao Forró. “É orgânico”

Camila e Enrique (foto tirada do facebook de Enrique Matos)

São apaixonados por Forró. Ela é portuguesa, ele é brasileiro e, há cerca de 2 anos, juntaram-se como par de dança, com o objetivo de promover a difusão desta cultura não só em Portugal, mas pelos países da Europa… ou até mesmo por todo o mundo.

Fiz a oficina de Forró dos bailarinos/professores Camila Alves e Enrique Matos, no Festival Andanças, e não pude perder a oportunidade de os entrevistar e de falar sobre este ritmo – proveniente do Nordeste do Brasil – e dos projetos profissionais de ambos.

Quase às escuras, durante uma noite bastante quente, entre as temperaturas elevadas e o calor de um baile de Forró, com pessoas felizes, descontraídas e com vontade de dançar até o sol nascer, sentados em troncos de árvores, Camila e Enrique contam que esta parceria era “inevitável”. Encontravam-se variadíssimas vezes em bailes, workshops e festivais, ela estava a regressar de Londres, onde esteve a estudar, e ele ia passar dois meses ao Brasil.

Camila ficou a substituir Enrique nas aulas do Espaço Baião – um centro cultural e escola de dança, criado pelo próprio –  e, quando o bailarino regressou, começaram a trabalhar  juntos. “Olho para a Camila como uma irmãzinha mais nova. Brigamos muito, porque temos visões diferentes, mas é para seguir em frente, para evoluirmos”, afirma Enrique Matos, quando questionado acerca da sinergia que os une. A bailarina acrescenta: “Discutimos em termos de conceitos, de futuro, mas isso faz com que cresçamos. Cada um tem a sua linha de pensamento e, por vezes, chocamos.”

Forró: música, dança. Cultura

Muito mais que um estilo musical ou de dança, o Forró é considerado pelos “forrozeiros” como uma cultura. Tal como foi já referido este ritmo nasceu no Nordeste Brasileiro e rapidamente se difundiu pelo resto do país. Resulta do tradicional “dois para lá, dois para cá” e sofreu influências, nos anos 90, de ritmos como a Salsa, o Samba de Gafieira e o Samba Rock.

Para Camila Alves e Enrique Matos a disseminação desta cultura, na qual tanto têm trabalhado, está atualmente “mais forte que nunca”. “Estamos a seguir um caminho muito bom. Portugal está muito forte em relação à Europa e ao resto do mundo, provavelmente devido ao idioma, pois as pessoas percebem as letras das músicas”, diz Camila.

E desenvolve: “Contudo, achamos que não houve ainda um boom, o que não é mau, porque conseguimos ter um cuidado maior com aquilo que o Forró se vai tornar no futuro. Em muitas outras danças não é possível fazê-lo, por se terem tornado demasiado comerciais.”

Enrique afirma que as pessoas estão cada vez mais curiosas em relação ao Forró e a toda a cultura envolvente: “Não ensinamos apenas em sala de aula a dançar. Fazem-nos muitas perguntas e nós ensinamos até mesmo sentados no chão, a falar sobre Forró”.

O mundo de Camila

Natural de Lisboa, 25 anos, Camila Alves teve contacto com a dança desde criança. A sua mãe dava aulas no Andanças e esta bailarina começou a participar no festival desde os 11 anos e a dançar ritmos como Tango, Kizomba, Salsa e Hip Hop. Em 2010, decidiu aprender outro estilo, teve contacto com o Forró e “acabou por ser natural”, apaixonou-se. “Conheci o Forró aqui no Andanças e, por isso, poder, hoje, dar aulas aqui é super gratificante.”

Foto tirada do Facebook de Camila

Em 2013, foi viver para Londres, onde se licenciou em Business Management with Marketing. No entanto, não deixou de percorrer o seu caminho no mundo do Forró e avançar com a sua carreira. “Quando regressei a Lisboa consegui criar um caminho mais duradouro.”

Especializada em Styling feminino, a bailarina dá aulas regularmente por toda e Europa em festivais e workshops. Além disso, Camila luta também pela igualdade de género na dança, promovendo debates e palestras para a consciencialização deste tema.

“O que pretendo é mostrar que as mulheres podem mudar muita coisa. Não têm de ficar na sombra dos homens ao dar aulas”, salienta e acrescenta que, no geral, “o Forró já está mais democrático”

“Ainda há barreiras por quebrar, mas estamos no bom caminho. Deve haver a liberdade de troca de papéis e, se assim o entenderem, as mulheres devem poder conduzir e os homens, seguir.”

Enrique é da mesma opinião e está nesta luta com Camila. “Promovemos estes debates porque achamos importante que se fale de muitos assuntos, como a forma de lidar e de estar no Forró e esta questão do género na dança e do empoderamento da mulher a que, atualmente, assistimos e que é mais do que necessário”, afirma.

E acrescenta: “O grande problema é que as pessoas que realmente precisam de estar e ouvir o que é dito nestes debates não estão presentes para conversar.”

Enrique veio para Portugal e trouxe consigo o Forró

“Sempre pensei em Forró, é orgânico”, esta frase foi dita por Enrique, enquanto falava desta sua grande paixão. O bailarino e músico nasceu na cidade de Conceição do Mato Dentro, no interior de Minas Gerais, e começou, desde muito cedo, a envolver-se com músicos e produtores, passando a ser frequentador de casas de Forró e de aulas deste ritmo. Mais tarde, começou por se destacar por ser pioneiro na organização de bailes e festas de Forró em vinil, na Europa.

Foto tirada do Facebook de Enrique Matos

Atualmente, com 33 anos, Enrique vive em Lisboa. Quando veio para Portugal não deixou de trazer esta cultura consigo. “Não tinha como vir sozinho. Fiz questão de trazer todas as minhas ‘coisinhas’ que me lembravam o Forró e a paixão – CD’s e equipamentos”, recorda com um sorriso no rosto. E continua: “Quando cheguei fui-me logo enturmando, comecei a passar som e, passado um ano, abri a minha primeira aula e o meu primeiro baile.”

E assim foi apostando e dando continuidade ao seu trabalho que, hoje em dia, é tão apreciado e considerado uma referência. Criou o Projeto Forró de Lampião, com o qual levou o Forró a muitos palcos da cidade de Lisboa: Fábrica do Braço de Prata, Voz do Operário, Santiago Alquimista, Teatro do Bairro, B.Leza, Mercado da Ribeiro, Teatro da Comuna, Teatro a Barraca, entre outros.

E, finalmente, em 2015, encontrou instalações, no Ateneu, onde pode concentrar todas estas atividades e criou o Espaço Baião, um centro cultural e escola de dança,  cuja missão é tornar-se uma referência nacional e internacional no que toca a formar novos bailarinos e elevar o nome e a cultura do Forró no mundo.

“Era um espaço onde respirávamos cultura, um local de partilha, totalmente decorado e muito voltado para o Forró”, lembra Enrique. E continua: “Atualmente, estamos sediados nos Anjos 70, antiga Taberna das Almas, em Lisboa, que é também muito atrativo. Um centro de jovens, com um grande giro de público, onde acontece muita coisa alternativa. Muita arte.” No Espaço Baião são dadas aulas regulares de Forró e Samba de Gafieira, com vários níveis, e organizados bailes semanais, atividades mensais e feitas parcerias e eventos anuais.

Segundo Camila, neste Espaço são dadas aulas de segunda a quinta-feira, e qualquer pessoa que esteja interessada em aprender e dançar pode e deve inscrever-se. “O Forró é muito inclusivo, aceitamos pessoas de todas as idades.”

Mas Enrique não ficou por aqui e, para além de bailarino, professor e Dj, este artista é também músico, e, em 2013, fez nascer o grupo Luso Baião, que, hoje em dia, é uma referência na Europa.

Foto tirada do Facebook de Luso Baião

“O Luso nasceu da necessidade de ter um projeto musical a nível profissional que representasse o Forró. Em poucos anos conseguimos que se tornasse bem reconhecido e respeitado. As pessoas conhecem a nossa música, gostam e partilham. É muito gratificante”, diz Enrique com contentamento.

O grupo Luso Baião é constituído por Cícero Mateus, voz e violão; Betinho Mateus, voz, triângulo e percussão; Enrique Matos, Zabumba; Everton Coroné, Acordeon; Pedro Guimarães, Guitarra; Jackson Azarias, Baixo; e Daniel Guedes, Percussão.

No Facebook e site do Espaço Baião está toda a informação necessária sobre os eventos que organizam, como sejam os internacionais Baião in Lisboa Festival, que este ano se realiza de 7 a 9 de dezembro, e o Maria Bonita Ladies Festival, entre outros eventos.

Matias: “Danças Tradicionais Europeias estão no bom caminho”

Como era de esperar, durante o Festival Andanças, em Castelo de vide, cruzei-me com o músico e professor de Danças Tradicionais Europeias, Matias, e não pude perder a oportunidade de o entrevistar.
Sentados em dois fardos de palha, que se encontravam em frente à “barraquinha” da programação, falámos sobre a sua carreira profissional, o gosto que tem por esta área e os projetos nos quais está envolvido.
Afirmando-se “totalmente dedicado à música e danças tradicionais”, Matias diz que a evolução da divulgação e promoção das mesmas, em Portugal , “tem sido muito gradual, porém positiva”. Encontrando-se “no bom caminho”.

Matias (foto tirada do Facebook do Festival Andanças)

Histórias – Participas no Andanças desde 2001. O que significa para ti este festival?Matias – Significa muito! Partilha, alegria, convivo… Associado à música e à dança tradicional, que é 100% deste festival. O objetivo do Andanças é manter a cultura e a tradição dos vários países e descobrir novos estilos de danças, de músicas e de sons. Tudo se cria e se recria!Este festival é como que uma terapia! O corpo fica muito cansado, mas a mente fica limpa. Aqui esquecemos o nosso dia-a-dia e há sempre muita descontração.

Histórias – És mais que um voluntário aqui no Andanças. Tens uma parceria de organização. Correto?
Matias –
Sim, tenho uma função diferente. O voluntário, que é muito importante neste festival, tem o seu turno de quatro horas diárias. Eu tenho de estar sempre disponível. Além de que, por estar envolvido na coordenação do festival, já estou a trabalhar desde março. Analiso e seleciono as candidaturas dos artistas, contacto-os, trato da programação e de tudo o resto… Viagens, custos, entre outras tarefas.

Histórias – Como é que surgiram as Danças Tradicionais Europeias na tua vida?Matias – Se pensar bem, tudo teve início em miúdo, quando comecei a dançar no rancho folclórico da minha freguesia, na Figueira da Foz. Em 2001, “cai de paraquedas” no Andanças. Pensava que era um festival de Salsa, mas era muito mais que isso. Era de danças tradicionais e a descoberta nasceu ali!

Histórias – Curioso, o início da tua vida profissional acaba por estar ligado ao Andanças?!
Matias –
Sim, quase que começou tudo ali!

Histórias – Fala-nos um pouco do teu percurso profissional?
Matias –
Tirei Engenharia Eletrotécnica, em Tomar, cidade onde exerci esta atividade durante nove anos. Nesse período, fui também conhecendo as danças tradicionais, assim como outras atividades, como ator, por exemplo. Numa ocasião, a Associação PédeXumbo convidou-me para ajudar na programação do Andanças e, a partir dai, a minha vida mudou.
Já tinha criado a Tradballs, que, atualmente, é uma cooperativa cultural e comecei a dedicar-me mais a esta área… Hoje em dia, sou produtor, programador, músico, professor de danças e muito mais.
Coloquei a Engenharia de parte e estou totalmente dedicado à música e à dança.

Histórias – Durante todo esse tempo de descoberta das diferentes danças, tiveste de fazer formação…
Matias –
Sim, fiz várias formações e workshops, com professores portugueses e estrangeiros. Fui aprendendo, cada vez mais, sobre as várias danças, as suas histórias e os métodos de ensino, assim como a desenvolver o meu próprio método de ensinar e de lidar com estas danças.

Histórias – Não tens saudades da Engenharia?
Matias –
Tenho. Claro que sim. É uma área muito interessante. Tenho saudades da atividade em si, daquilo que fazia. Não dos horários rígidos, que obviamente são importantes em todo o lado, mas…

Histórias – A Tradballs foi criada em 2005. Quais os objetivos desta cooperativa?Matias – São muito simples, basicamente passam por dar continuidade ao trabalho que a Associação PédeXumbo já fez: divulgar e promover, cada vez mais, as Danças Tradicionais Europeias. Focamo-nos nas danças europeias, não estamos com as africanas, americanas, nem brasileiras.
Estamos sediados em Lisboa, onde fazemos o nosso maior trabalho de divulgação. Porém, claro que, sendo contactados, vamos a outras zonas do país.
Desde há alguns anos, temos também parcerias com juntas de freguesia e câmaras municipais, que contam connosco para os seus eventos. Damos aulas de dança em Lisboa, no Teatro da Luz, às segundas e terças-feiras. Às quartas, estamos na Fábrica Braço de Prata com as “Tertúlias TRAD”, onde os alunos podem colocar em prática o que vão aprendendo. Uma vez por mês é com música ao vivo.
A cada 15 dias, consoante a agenda, realizamos um evento de Danças Tradicionais de Lisboa, que podem ter lugar no Teatro da Luz, no Teatro Ibérico ou no Museu de Arte Popular.
Temos ainda a fusão das aulas com os bailes, ou seja, os festivais. Em Lisboa, organizamos o “FEST-i-BALL”, nos finais de março e de outubro. No final de junho, o “Festival Raiz d’Aldeia”, na Aldeia de Xisto, em Janeiro de Cima, concelho do Fundão. Fazemos, ainda, em dezembro/janeiro, em Coimbra, o “Festival da Passagem d’Ano”. E, além disso, temos uma parceria com a Câmara Municipal de Tavira, a fim de participarmos na Feira da Dieta Mediterrânica, que se realiza sempre na primeira semana de setembro.

Histórias – E o grupo musical Fulano, Beltrano & Sicrano, como é que surgiu?
Matias –
Surgiu de uma forma muito engraçada. O beltrano, Vicente Camilo, acordeonista, começou a dar espetáculos a solo. Entretanto, entre conversas, fui fazer um concerto com ele, tendo surgido o grupo Fulano e Beltrano. Eu, como fulano, com a precursão e ensino das danças.
Passado um ano, encontrámos o nosso amigo, David Rodrigues, com a sua guitarra, e nasceu o trio Fulano, Beltrano & Sicrano!

Histórias– Quando é que descobriste também este teu dom musical?
Matias –
Descobri por acaso! Tenho muito mais formação em dança do que em música, mas fui sempre colaborando, mantendo contactos e trocando ideias com músicos. Fui vendo e analisando como é que tocam e arrisquei um pouco. Troquei algumas impressões e aprofundei.
Nem me considero músico. Toco e estou muito ligado à precursão, porque está relacionada com o ritmo, que, para mim, é muito interessante! Mas, não consigo tocar outros instrumentos.

Histórias – E o jam.pt?
Matias –
Também surgiu de forma engraçada e muito caricata! Os outros dois músicos são do Porto. O João toca violino e o Abel, concertina e guitarra. Eu estou na precursão, claro. E o nome “jam.pt”, está mesmo a ver-se como surgiu: “j” de João, “a” de Abel e “m” de Matias.”pt”, de Portugal!
Fui contactado por uns amigos de França, que queriam que fosse dar um workshop de danças portuguesas, mas pediram-me que levasse, músicos para fazer um baile. Lembrei-me deles e liguei-lhes.
Mais tarde, candidatei-me para ir a um festival, também em França. Fui selecionado e perguntei ao Abel e ao João se queriam participar. Foi nessa altura que seguimos em frente com o grupo.

Histórias – Com tantos projetos, como é que geres o teu tempo?
Matias –
Consegue-se gerir. Somos uma espécie de freelancers. Não temos horários rígidos e vamo-nos organizando. Umas vezes, tenho todos os dias da semana e do fim de semana ocupados. Outras, não.
Mas gere-se! Com os Fulano, Beltrano & Sicrano é mais simples porque estamos todos em Lisboa e, facilmente, ensaiamos. Com os jam.pt, inicialmente, tínhamos de nos encontrar para trabalhar. Agora, já é possível fazer apenas revisões de alguns temas antes dos concertos.

Histórias – Como avalias a divulgação e a promoção da música e das danças tradicionais em Portugal?
Matias –
Estão no bom caminho! Por vezes, perguntam-me por que é que as danças tradicionais não são mais divulgadas ou por que razão não se realiza mais festivais e bailes por todo o país.
Por muito que tentemos explicar às pessoas o que são danças tradicionais, não é fácil. É preciso arranjar sinónimos ou fazer comparações que, na realidade, não são totalmente verdadeiras. Ou seja, só se consegue explicar, convidando as pessoas a participar, a ver e a discutir.
Só assim é que se vai conseguir. Ou seja, não é apenas com a divulgação, porque ao ouvirem falar em danças tradicionais, as pessoas associam a rancho ou a pimba, o que não é verdade! Esta evolução tem sido muito gradual. Porém, positiva, porque não houve um boom, de um dia para o outro. Tem sido passo a passo.
Há uns anos, pensávamos que, com o tempo, íamos ter cada vez mais gente. E realmente temos, mas quem participa nestas atividades, fá-lo durante dois ou três anos e sai, segue outros caminhos e, em simultâneo, novas pessoas vão entrando. Tal como o tema, deste ano, do Andanças, é uma “roda viva”, que está sempre a ser renovada.

Histórias – Que projetos tens para o futuro?
Matias –
Continuar a fazer o mesmo trabalho, se possível mais e melhor. De qualquer forma, se conseguirmos manter as coisas como estão, já é muito bom!

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